quarta-feira, março 31, 2004

Superior o Eterno Problema

Porque se agitam tantos milhares de estudantes pelo país, fazendo renascer um espírito de crítica e luta que para muitos estava enterrado desde os tempos de uma geração que passou à História como “rasca”, enterrada no cinismo do cavaquismo militante de à 10 anos?
Existem várias questões centrais, sendo a mais conhecida a das propinas, mas não se julgue que é a única. Contra muitos fazedores de opinião, os estudantes do ensino superior tem posto na rua a injustiça de uma propina que chega aos 852 euros, representando um aumento de 140% (Imagine-se o tumulto se qualquer outro bem subisse tanto...). Que sistema justo permite que a diferença ente a subida das bolsas e o das propinas seja mais de 130 %?
Para todos os pseudo-conhecedores da situação e que criticam a posição dos estudantes, relembro que o artigo 74 da nossa constituição, fala da progressiva gratuitidade de todos os sistemas de ensino. E para quem como eu prefere uma análise económica da situação, prova-se que os ganhos para o país de ter uma mão de obra qualificada são extremamente elevados ( o que em Economia é conhecido por Externalidade Positiva), pois uma população mais qualificada leva ao crescimento económico do país, permitido uma maior capacidade de inovar.
Além de todas as questões económicas e legais, existe aquela que para mim é uma questão de fundo, uma subida tão acentuada, gera que o ensino e a sua democratização ande muitos passos para trás. E aquela que mesmo constitucionalmente (artigo 73) devia ser uma das formas de suprimir as desigualdades de oportunidades é apenas uma das formas mais refinadas de as aumentar. Já que para uma família de recursos médios ou baixos, 852 euros é mesmo muito, não permitido o ineficaz sistema de bolsas resolver nada.
É que não são só os 852 euros: Os livros( cada a rondar 50 euros), fotocopias e demais materiais já faz muita mossa às bolsas dos alunos não deslocados. Imagine-se aqueles que como eu são deslocados( em Tomar, temos muitos) e que tem inúmeros gastos na brutal especulação imobiliária e na alimentação e transportes cada vez mais caros. Estes alunos, que saíem do apoio da família são os mais esquecidos de um sistema que permite que eles paguem centenas de euros em rendas( Cerca de 200 em Lisboa), sem nenhum recibo ou garantia. É que esses estudantes que vão para fora, tirar um curso que a sua terra não lhes pode dar, tem de ser incentivados e ajudados finalmente.
Outra grande luta é a retirada dos alunos dos órgãos de gestão, perdendo a actual paridade...que fazia das escolas uma democracia e permitia mesmo condicionadamente a luta pelo interesse dos estudantes. Uma universidade que não pensa nos estudantes, o que é afinal? Uma Empresa? Não sei...decidir sem o apoio dos lesados e interessados não é o correcto. Ou talvez seja para este governo?
O problema do ensino superior nacional, não é só os 852 euros, mas acreditem que agrava tudo...já que não são eles que aumentam a já muito débil qualidade de bibliotecas e computadores. Quanto mais aumentar a qualidade pedagógica...

Hugo Costa.
(publicado no jornal «Cidade de Tomar» de ...)