Perto que estamos de mais um momento de consulta popular, é ainda necessário e importante, esclarecer porque se defendem determinadas posições para uma compreensão real dos motivos, afastando todos os equívocos. Neste referendo muitos defendem o sim, muitos outros defendem o não por razões da sua consciência, moral ou ética, sendo que o mais importante é que as pessoas tenham a verdadeira noção do que está em causa, para assim, poderem tomar a sua posição.
A interrupção voluntária da gravidez, vulgo aborto, é um tema polémico pois envolve muitos preconceitos, no entanto, é necessário termos a noção de que o aborto existe, embora seja ilegal. Acontece que, o aborto clandestino origina todos os dias a entrada de mulheres em urgências hospitalares ou pior que isso, origina muitas vezes a morte das próprias mulheres, que depois de uma tomarem uma decisão física e emocionalmente dura ainda tem de se sujeitar a clínicas clandestinas, onde a intervenção não é feita da forma mais correcta e onde os cuidados são poucos ou nenhuns, simplesmente porque não tem dinheiro para se deslocar ao país vizinho para terem o mínimo de condições. Outro aspecto importante é a criminalização deste acto, que tem levado muitas mulheres a serem alvos de processos judiciais, passando uma autêntica humilhação e chegando até a serem alvo de discriminação por parte de outros. Uma coisa, todos sabemos, o aborto ou “desmancho” não é uma prática recente e merece mais e melhor atenção.
No entanto, surge uma questão essencial: será que alguém tem o direito de julgar o próximo pelo simples facto de ter tomado uma decisão com a qual não concorda? Pois eu acho que não! Neste referendo estão em causa valores bem mais importantes do que acusar alguém porque tomou uma decisão que muitos não tomariam. E já agora, já alguém se tentou pôr na pele de uma mulher que tem tal decisão a tomar? Acham que é fácil? Tomar esta decisão implica muita reflexão e deixa nas mulheres marcas psicológicas muito profundas.
Nesta consulta popular, o que está em causa é a descriminalização de uma decisão de consciência, bem como a dignidade das mulheres que optam por fazer a interrupção voluntária, garantindo efectivas condições para a sua realização, para que esta dura decisão seja acompanhada de bons cuidados de saúde e de um efectivo planeamento familiar bem como, de dignidade, tanto física como psicológica.
É importante perceber que não se pretende uma liberalização do aborto e muito menos uma visão deste como um método contraceptivo, pretende-se antes que este seja legal, para que possa ser realizado por equipas especializadas que cuidem da saúde destas mulheres, acabando com as horrorosas consequências do aborto clandestino, como a impossibilidade de voltar a ter filhos ou a até mesmo a morte delas.
Acredito que se a interrupção voluntária for legal o número de abortos não vai aumentar em massa só porque é legal, bem como na redução dos abortos clandestinos.
Eu defendo o sim, porque quero que as mulheres possam ter mais saúde, mais dignidade e mais justiça, defendo o sim porque não acho justo que alguém que o faça, ainda que na clandestinidade, seja apontada e difamada na praça pública só por ter decidido fazê-lo. Digo sim, porque não posso compactuar que muitas mulheres continuem a morrer, fiquem física e psicologicamente afectadas por não terem tido um acompanhamento adequado e mais ainda porque acho que é descabido que uma mulher seja julgada e condenada por tal decisão. Defendo o sim, estou convicta de que este é o caminho para resolver este problema, que por muito controverso não podemos atirar para debaixo do tapete, não podemos continuar a fingir que não existe.
É porque defendo a saúde e dignidade, que no próximo dia 11 vou votar sim!
Susana Faria
Artigo Publicado - Jornal Cidade Tomar