sexta-feira, abril 02, 2004

Tomar, Diferentes Perspectivas

A nossa querida cidade de Tomar apareceu na passada semana referenciada no Guia da Habitação do jornal Expresso, como a décima sexta cidade mais bem cotada para se viver, lado a lado com Sintra. É um facto que deveria encher de orgulho e regozijo todos aqueles que, como eu, amam esta cidade e teimam em viver nela. Não soubéssemos nós, que não é bem assim. Se assim fosse, porque facto estranho é que a população decresce? Porque migram os jovens e menos jovens para outros locais?
A verdade, é que embora seja a cidade melhor posicionada do Distrito, além de Tomar só Santarém foi analisada, e por muito que goste de Tomar, e por cá viver pague a factura todos os meses, tenho que reconhecer que as cidades à nossa volta gozam indiscutivelmente de mais acessibilidades, habitação mais barata, mais emprego. E isto, por mais condicionantes que existam, só se pode dever a uma coisa: maior capacidade política por parte daqueles que dirigem os destinos dessas cidades, em detrimento da nossa.
Diz-nos o referido Guia, que Tomar é uma cidade cujo principal sector de actividade é o Terciário, ou seja, o comércio e os serviços. Mas, será que podemos dizer que é disso que vive a nossa cidade e o nosso concelho? Existe algum plano estratégico, alguma orientação de quem gere a nossa autarquia nesse sentido? Onde está o desígnio, qual é o caminho para Tomar? Em seis anos de autarquia PSD, ouve alguma indicação desse caminho a seguir? Poderemos de facto dizer que vivemos do comércio e dos serviços, uma cidade central na sua região, que deixa fugir para os concelhos limítrofes tudo o que implica quadros técnicos? Sabemos que muitos dos que ainda cá vivem, são «uma percentagem assinalável de habitantes que trabalham nos concelhos vizinhos ou mesmo em Lisboa, isto é, população potencialmente disponível para deixar de habitar em Tomar», como diz Bruno Graça no seu artigo de 19 de Março no Cidade de Tomar. No mesmo artigo diz ainda: «O Concelho e a cidade de Tomar terão também perdido, em valor absoluto, mais de cinco mil postos de trabalho nos últimos 40 anos. A perda de população e o seu envelhecimento é a principal consequência desta drástica perda de capacidade de emprego em Tomar.» Ora, como é que se vive dos serviços e do comércio, quando as pessoas começam a escassear?
Mas se não é este o nosso caminho, então qual é? A indústria está mais que visto que não. Será o Turismo? Numa cidade em que se fecha um parque de campismo, único nas suas características, em pleno Verão da Festa dos Tabuleiros; numa cidade sede duma Região de Turismo cujo trabalho conhecido é zero; numa cidade em que não se atribui ao respectivo Vereador as competências e valências necessárias para a execução dum trabalho profícuo, ou numa cidade que ainda há pouco passava todos os dias na televisão e cuja autarquia não tem sequer um site oficial na Internet para os que queiram saber onde fica e como é esta nossa pérola – é assim que damos primazia ao Turismo? Será difícil acreditar que haverá muitos portugueses ainda que desconhecem onde fica Tomar, e que o pouco que de nós sabem é que temos uma janela engraçada que viram nos livros, e uma festa em que umas senhoras vestidas de branco levam umas “coisas” à cabeça?
Viramo-nos então para a Educação? Os governos PS deram-nos a benesse de termos um Politécnico num distrito onde já havia outro, podemos considerar-nos privilegiados. Mas o que fazemos com ele?, que incentivos criamos à Educação, aos jovens que se formam e que não encontram aqui terreno para cultivar e praticar aquilo para o qual se formaram. Que ligações existem entre o Politécnico e a cidade, para além da economia paralela do arrendamento?
Talvez queiramos ser uma cidade cultural, o tal Guia diz que temos cinco salas de espectáculos, mas a verdade é que não temos uma única com um palco com dimensões suficientes para trazer uma verdadeira Orquestra, e a nossa sala para fazer concertos mais “mexidos” é… nos pavilhões da FAI. Temos uma cidade e um concelho ricos em associações culturais, mas na maioria das vezes prefere-se pagar a quem vem de fora, sendo que a Câmara se substitui às associações como entidade cultural em vez de as apoiar melhor, ainda para mais muitas vezes em espectáculos de qualidade duvidosa, de alguns iluminados que vêm cá enganar o “povinho”. Abra-se um parêntesis para dizer: Parabéns, finalmente os Quinta do Bill tocaram em Tomar a convite da Câmara, pena é que tenha sido só para alguns, é que convites, nem vê-los.
Mas o tal Guia apresenta mais algumas coisas curiosas, por exemplo, diz-nos que a taxa de cobertura de esgotos (na cidade) é de 100%. Mas para onde estão a escoar os nossos esgotos, para a ETAR, ou para o rio?
Diz-nos ainda que Tomar «apesar de ser mais ou menos acessível e de ter relativamente pouco trânsito, a sua sinalética leva muitas vezes o visitante ao engano.». Cá está a tal cidade vocacionada para o Turismo.
Parece de facto que as pessoas nunca estão contentes, ou que a oposição (alguma!) só sabe dizer mal, pois se quando um jornal nacional, e dos mais considerados, nos dá este destaque, aparece logo alguém a criticar e a dizer que não é assim. Mas meus senhores, a verdade é que quem ama a sua terra não pode fechar os olhos, e andar emproado com falsos galões e a ilusão dum passado histórico que nos permita viver serenos e sem preocupações. Temos que opinar, criticar, intervir!
E há tanto, que é difícil até escolher por onde começar: Onde estão a criação de postos de trabalho? De fixação de empresas? Onde está a política de Habitação Social, Habitação a custos controlados, ou a criação de bolsas de terrenos que permitam à autarquia equilibrar o jogo de interesses dos privados? Onde está, passados seis anos, a revisão do PDM com que o senhor Presidente da Câmara, suposto especialista, se elegeu? Onde está a conclusão do IC3, e o IC9? O projecto da Refer que o Presidente tanto gosta de mencionar, anda ou não anda? E o Pólis, só se faz o que não interessa?, os dois inúteis, por onde e como estão a ser feitos, parques de estacionamento que vamos ficar a pagar por muitos anos? E o pavilhão que foi “remodelado” a cem por cento? E a relva do estádio que faz inveja a muitos, e se quer arrancar para no mesmo local construir um campo sintético? O Pólo Ciência Viva… morreu?
E o exercício interno da autarquia… funciona bem? Os funcionários estão contentes e motivados? Os recursos estão a ser optimizados? A autarquia funciona em rede? Existe o correcto e necessário apoio às freguesias? O planeamento nesta Câmara é o que todos conhecemos: constrói-se hoje, amanhã destrói-se para fazer diferente, mas afinal ainda faltava qualquer coisa, destrói-se outra vez! Fecha-se aqui sem dizer nada a ninguém, abre-se ali porque apetece, etc, etc.
É certo que nalguns aspectos a nossa cidade tem melhorado, tem ficado mais bonita, não me referindo obviamente à cibernética, aos patos gigantones no rio, ao mau gosto com que foi decorada a corredora, ao futuro parque de estacionamento atrás da câmara, à conservação da Mata dos Sete Montes, às cruzes dos templários que ornamentavam as nossas calçadas e que já quase desapareceram, ao lixo que enche o rio em dias de mercado, ao fórum romano, aos acessos pedonais ao Hospital… mas também, se não me referir a isto, refiro-me a quê?
O que é que podemos afirmar que foi feito com real importância? Mais espaços verdes? Mais zonas de acesso e usufruição do rio? O melhor aproveitamento da zona envolvente do Castelo e Convento, ligando-os à cidade? Não, não, não e por aí fora… E para as novas zonas de expansão da cidade, como a zona das Avessadas, está prevista alguma zona de convívio e de realização de actividades, ou estaremos sempre dependentes da nossa Praça da República? E a Choromela, vai ser o Bairro 1º de Maio do século XXI? E os acessos a toda esta zona?, não me digam que são pela ponte do Flecheiro? E o actual Bairro 1º de Maio, quando é que se faz alguma coisa por ele?
E acima de tudo, e muito importante, quando é que se define concretamente qual é, e se criam instrumentos nesse sentido, de um rumo para Tomar, qual é o Plano Estratégico para este concelho, o que é que nos vai levar ao futuro e ao desenvolvimento sustentável? Muito simplesmente, antes que esta terra seja apenas um bairro para gente rica, vai Tomar por onde?

Hugo Cristóvão
(publicado no jornal «O Templário» de 1.04.2004)